sexta-feira, 24 de abril de 2015

Memória Descritiva

Atualmente, a tipografia está presente um pouco por toda a parte, sendo um elemento visual que carrega consigo um enorme caráter simbólico. Em casa ou na rua, podemos encontrar diversos tipos que nos remetem para características diferentes. As próprias marcas que pretendam vender um produto diferem o tipo de letra dos seus logótipos para exprimir diferentes características junto do público alvo. Uma marca que atenda a um público mais juvenil, dificilmente optará por um tipo de letra mais clássico, por exemplo.

"Existem várias formas de dizer o que é a tipografia. A maioria das pessoas identificaria a tipografia como um local onde se fazem impressões, nomeadamente de recibos, papéis de carta e envelopes, coisas relacionadas com as papelarias dos ofícios administrativos." (Sandro Lopes)

"De acordo com a definição do Grande Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, tipografia  é o “conjunto de procedimentos artísticos e técnicos que abrangem as diversas etapas da produção gráfica (desde a criação dos caracteres até a impressão e acabamento), espelhados  no sistema de impressão direta com o uso de matriz em relevo"" (Felipe Araújo)

Para Felipe Araújo, "as composições tipográficas têm como objetivo a boa legibilidade e a construção de um visual envolvente, que atraia o leitor e contextualize com o conteúdo e o intuito da publicação".

"A função primordial da tipografia é a comunicação da linguagem verbal. É através do verbo que descrevemos sentimentos, pensamentos e os comunicamos a outros que partilham dos mesmos códigos linguísticos, e a nós próprios. Enquanto esses códigos se mantiverem, o conteúdo escrito será perpetuado. Desta foram, a tipografia assume um papel de "formalizar e imortalizar a memória", e todas as ciências humanas se baseiam nesta premissa." (Sandro Lopes)


Tendo isto em conta, procurámos que a nossa composição visual transmitisse algo através dos próprios tipos.

Efetivamente, este percurso, que à partida já não se avizinhava fácil, acabou mesmo por não o ser, na medida em que apenas à quinta tentativa obtivemos um resultado que fosse ao encontro das nossas expetativas/objetivos no que diz respeito à relação da composição com o texto utilizado.

Inicialmente, utilizámos o Hino Nacional para criar a respetiva bandeira e, desta forma, transmitir valores inerentes à nossa Nação como o orgulho e a determinação. No entanto, a nossa composição tornou-se demasiado figurativa, com as letras e as palavras em si a não realçarem esses mesmos valores que já referimos. Na composição, a cor verde reflete a esperança e o mar, sentimentos inerentes aos valores da pátria; a cor vermelha, representativa da força, coragem e do sangue derramado nas batalhas; a cor amarela, presente na esfera armilar, representa as conquistas do povo português.

Numa segunda tentativa, decidimos utilizar a música “Imagine”, de John Lennon, conhecida mundialmente e associada a um momento que marcou a história dos Estados Unidos da América e do mundo, o 11 de Setembro. Procurámos enfatizar a dicotomia entre o mundo “perfeito”, sem guerra, e aquele que se verificava na altura, presente na letra da canção. Mais uma vez, a nossa composição não estava a ir ao encontro da essência desta proposta de trabalho, pois, apesar de compararmos o “paraíso” com o cenário de guerra, voltavamos a não encontrar aquele sentimento transmitido pela tipografia. Ao centro, está presente uma espécie de balão de pensamento com o texto na íntegra e a palavra “ Imagine” destacada. Isto remete para a imaginação dos dois mundos antagónicos. Na parte superior, um mundo calmo onde predomina a paz, traduzido pelo céu claro com nuvens brancas (cor da paz). Pelo contrário, na parte inferior, o cenário altera-se por completo, predominando a guerra e o sofrimento, com uma alusão ao famoso atentando com o avião a embater nas torres gêmeas. Ao lado, está presente uma imagem figurativa do fogo.

Posto isto, passámos à terceira tentativa, onde quisemos criar um cenário espacial, ao estilo da Guerra das Estrelas, recorrendo, para tal, à canção “Call me a Spaceman”, do DJ holandês Hardwell. Ainda numa fase inicial da realização da composição, percebemos que este trabalho já ia de encontro ao objetivo principal deste desafio mas considerámos que não teríamos material suficiente para prosseguir e alcançar algo que exprimisse a mensagem subjacente ao conteúdo espacial da música. Inserimos o título da canção recorrendo ao tipo de letra “Agency FB”, tentando recriar um feixe de luz. O mesmo sobre um fundo preto, cor normalmente associada ao vácuo pertencente ao espaço.

Na quarta tentativa, optámos por algo diferente ao recriar o logótipo da Liga dos Campeões. No entanto, a juntar-se ao problema da imagem figurativa, que podia ser alcançada com pontos, surgiu-nos outro entrave, sendo este o facto de, na composição, os elementos da mesma se encontrarem muito próximos entre si, tornando-a algo confusa e “pesada” para o leitor. Mais uma vez, não conseguimos chegar ao pretendido pelo docente e por nós próprios. Ainda assim, com esta imagem, tencionávamos apelar à universalidade própria da competição, vísivel no facto de termos utilizado os trinta e dois clubes participantes para construir o logótipo. Utilizámos um tipo de letra distinto para cada clube, de modo a representar as caraterísticas individuais dos mesmos. Colocámos também o hino oficial da competição, escrito em três idiomas diferentes, com o objetivo anteriormente referido.

Por fim, surgiu-nos a ideia de recorrer a um poema de um dos grandes escritores lusos, Fernando Pessoa, e escolhemos o poema “Nevoeiro”, inserido na obra “Mensagem”, do mesmo autor. Do nosso ponto de vista, o texto em si é favorável à criação de um boa composição, já que nos remete para diversos sentimentos e características, bem como uma evolução do estado de espírito do sujeito poético ao longo de todo o poema. Também consideramos o tema interessante por ser tratar de um apelo ao renascer da sombra do nosso país.

O poema remete para uma nação adormecida, na penumbra e que necessita de ser incentivada à mudança. A ideia da penumbra é alcançada através da associação ao nevoeiro, simbolo de indefinição e de sombra.

Na primeira estrofe, o sujeito poético faz referência à situação de Portugal na altura: um país a “entristecer”, sofrendo de uma crise quer a nível político, quer a nível social (“ Nem rei, nem lei, nem paz nem guerra (...) Este fulgor baço da terra”). É notória ainda a existência de um tom melancólico remetendo para a falta de esperança.

Na segunda estrofe, verifica-se a caraterização de um país perdido (“ Ninguém sabe que coisa quer”) , onde há uma crise de valores morais (“ Nem o que é mal nem o que é bem”). No entanto, ainda existe uma réstia de esperança para que Portugal mude (“ (Que ânsia distante perto chora?) “).

No final, o “eu” poético faz um apelo aos seus “irmãos” para Portugal sair do adormecimento e da sombra em que se encontra, rumo a alcançar o “Quinto Império”.
Assim sendo, a nossa composição, com base no poema, consiste na colocação intencional da expressão chave no centro, cercada por um conjunto de palavras pertencentes ao campo semântico do “Nevoeiro” e da decadência, associadas ao país. Como pano de fundo, temos o poema na sua totalidade.

As palavras fortes, graças à forma como estão organizadas, ao seu tipo de letra e à sua cor, exprimem diversos sentimentos inerentes ao texto, tais como: indefinição, melancolia, dispersão e decadência. O gradual desvanecimento do texto enfatiza, por antítese, a crescente falta de ânimo e esperança. Esse desaparecimento pode ser encarado como uma situação irreversível, tal como aponta a queda interminável do conjunto de palavras. O uso de cores escuras como a preta simboliza essa mesma melancolia e também penumbra/obscuridade. Já o tipo de letra utilizado foi o “Chiller”, que demonstra , de igual modo, desorganização e falta de alegria, remetendo para o desespero e desânimo da população, os quais advêm da pouca racionalidade demonstrada pelas mesmas.

No núcleo da composição, surge o apelo que vem contrariar toda aquela aura negativa. Esta expressão, que é extremamente forte, é realçada pelo motivo de ser necessário “ acordar” o povo, já que este é o propósito maioritário da composição poética. Para tal, usámos o tipo de letra “Impact”, pois, tal como o próprio nome indica, esta tipografia causa um elevado impacto no leitor, captando, de imediato, a sua atenção. A cor amarela, neste caso, confere à expressão o papel/função de ser o “ sol” que iluminará Portugal na saída da penumbra, e no caminho para o “Quinto Império”.

Como fundo da nossa composição, encontra-se o poema na íntegra e aqui colocámos o texto com alguma opacidade com objetivo de não desviar a atenção do leitor da questão central do trabalho. Assim o leitor consegue ler todo o poema e contextualizar as palavras destacadas a cor escura.

Tivemos como base uma image preta com uma luz central branca mas, após um aconselhamento do professor, ao qual agradecemos, considerámos melhor retirar a imagem do fundo, de modo a utilizar elementos tipográficos apenas.


Para a execução do trabalho utilizámos o programa Adobe Illustrator CS6.

Em suma, a tipografia é vista como “uma actividade social de comunicação” (Paulo Heitlinger, 2006) e, como tal, pretendemos realizar um trabalho que exprimisse o conteúdo de um poema que, na nossa opinião, aborda um tema de extrema importância e que diz respeito a todos nós, fazendo tamém parte da história da nossa Nação.


Referências Bibliográficas:

Araújo, Felipe, in "http://www.infoescola.com/design-grafico/tipografia/"
https://www.evonline.com.br/simbologia-das-cores/
Lopes, Sandro, in "http://sdr-designer.blogspot.pt/2005/09/tipografia-definio.html"
Heitlinger, Paulo (2006) "Tipografia: Origens, Formas e Uso das Letras", DinaLivro Edições, Portugal

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